quarta-feira, 17 de outubro de 2012

Imprudência gramatical

Que estranha forma gramatical a primeira pessoa do futuro. Farei, partirei, conquistarei. Que louco a terá inventado? Como é ridículo aquele som final «ei», com toda a sua suficiência. Comprarei, construirei, escreverei. E se esse tempo não existir? Será que o pai desconhecido da língua não a considerou, essa fraca possibilidade? O inglês é mais decente: I shall do, I will do, há aqui uma intenção, uma vontade, nada mais, não se hipoteca nela o futuro. Enquanto nós, pobres diabos, nós caminhamos curvados, de olhos fixados no horizonte, embora talvez a uns 50 centímetros haja um buraco.

Dino Buzzati, In Quel Preciso Momento, 1963 [En ce moment précis (carnets), trad. de Jacqueline Remillet:Éditions Robert Laffont, Pavillons Poche, Paris, 2011].