segunda-feira, 1 de outubro de 2012

O país e a decadência administrativa

xxxO sr. Luciano de Castro, um dos chefes da oposição, fez no seu relatório uma exposição sombria sobre a administração do país. Aí confessa: que não há fé política, nem dignidade política; que não há partidos com ideias, mas fracções com invejas; que o país está caótico, desorganizado, entregue ao abandono; que cada reforma cai sucessivamente com cada governo; que as leis são um aparato de eloquência parlamentar e não uma eficácia de organização civil, etc. Numa palavra característica - que o país está na última decadência administrativa.
xxxRegistemos esta preciosa declaração do chefe da oposição; guardamo-la como uma jóia, - em algodão.

xxxNa reforma da administração, o sr. Sampaio, ministro do reino, termina com uma frase em que expõe que a administração, como está, é uma confusão vergonhosa, uma desorganização terrível, um abandono mortal.
xxxNuma palavra definitiva - que o país está na última decadência administrativa.
xxxRegistemos esta confissão sincera do sr. ministro do reino: guardamo-la como um bicho precioso, - em espírito de vinho.

xxxResultado: o ministro e o chefe da oposição - declaram oficialmente - o país num estado deplorável de administração. Ora:
xxxNem a reforma do sr. Luciano de Castro se efectua: nem a reforma do sr. Sampaio se aplica.
xxxDe tal sorte, o que resta? Que estamos num estado deplorável de administração - segundo confessa o governo e segundo confessa a oposição.
xxxE que ficamos nesse estado!

xxxA confrontação destas duas opiniões diz tanto, fala tanto, convence tanto - que levamos os nossos comentários para longe, discretamente, e deixamos as duas Senhoras Opiniões notáveis, só contigo, ó leitor contribuinte, para que tu lhes dês o braço, e ss.s.as as Opiniões te digam o que tens a esperar de Regeneradores, Históricos e Reformistas, - essas três maneiras constitucionais de dizer:
xxx- Vamos jantar!

Eça de Queirós, As Farpas, 9, Janeiro de 1872 (Principia, 2004)