quinta-feira, 19 de maio de 2011

Os objectos

Como têm de circular os objectos numa casa até encontrarem o lugar que lhes convém! Estamos há poucos anos na Place Falguière, e já cadeiras, candeeiros, quadros e estantes têm sido protagonistas de um périplo fatigante, que os leva de divisão em divisão e de recanto em recanto. Alguns, é certo, adaptam-se com facilidade e acabam por conviver pacificamente com os seus vizinhos. Outros, os insociáveis, os proscritos, não encontram posição nem lugar e circulam sem descanso de um espaço para o outro, sem lançar amarras em sítio nenhum. De uma maneira ou de outra, a contragosto, acabam às vezes por aceitar um desvão e ali levar uma vida que eu imagino plena de desconforto e de ressentimento. Mas há também os incorrigíveis, aqueles que não transigem em nada e que, como castigo pelo seu espírito subversivo, são enclausurados no fundo de uma gaveta ou na escuridão de um sótão. Objectos terríveis, condenados, que devem estar a tramar em silêncio alguma vingança atroz.

Julio Ramón Ribeyro, Prosas Ápátridas, Edições Ahab, Porto, 2011.