quinta-feira, 22 de março de 2012

Fealdade

FEIO. Depois de tantas infidelidades do marido, de tantas histórias dolorosas com a polícia, Teresa diz: «Praga tornou-se feia». Há tradutores que pretendem substituir a palavra feio pelas palavras «horrível» ou «insuportável». Parece-lhes ilógico reagir a uma situação moral com um juízo estético. Mas a palavra feio é insubstituível: a fealdade omnipresente do mundo moderno, misericordiosamente velada pela habituação, aparece brutalmente no mais ínfimo dos nossos momentos de desânimo.

Milan Kundera, «Sessenta e Sete Palavras», A Arte do Romance, Dom Quixote, Lisboa, 1988.