terça-feira, 13 de dezembro de 2011

O vale era verde

Estou a embrulhar os meus haveres no pequeno pano azul que a minha mãe costumava atar em volta dos cabelos quando limpava a casa, e vou-me embora do Vale. E desta vez para nunca mais regressar.

Deixo para trás sessenta anos de memória.
Memória.
É estranho que a mente esqueça tanto do que este momento é, mal ele tenha passado, e, porém, retenha tão clara e vivamente a memória do que aconteceu há muitos e muitos anos – de homens e mulheres há tanto tempo mortos.
Pois não há sebe nem cerca em volta do Tempo que passou. Pode-se regressar e ter de volta o que se quiser — se se puder recordar.
Assim, posso fechar os olhos sobre o Vale tal como ele existe hoje – e ele desaparece – e vejo-o tal como era quando eu era rapaz. Era verde e fértil das riquezas da terra. Em todo o País de Gales não havia outro tão belo, pois a mina de carvão apenas começara a alongar os seus magros dedos negros pelo meio do verde.
A escória negra – o desperdício das minas – apenas formava um pequeno monte, nessa altura, e a nossa pequena Capela dominava o Vale do local onde se erguia, no princípio da rua.
Tudo o que aprendi em rapaz foi com o meu pai, e nunca encontrei nada que ele tenha dito que fosse errado ou inútil.
Ele costumava contar-me coisas sobre o Vale e o seu povo – sobre os bravos homens que nunca se vergaram aos conquistadores Romanos, Dinamarqueses ou Saxões, até terem morrido tantos que as mulheres não conseguiam criar filhos suficientes para os substituírem.
Os Homens do Vale, há muito reunidos aos seus Pais – tornaram-se reais para mim, como se os tivesse conhecido cara a cara. Mas as batalhas que eles travaram há muito foram esquecidas, e, nós, os do Vale, travávamos agora uma nova luta — arrancar por debaixo do verde a riqueza negra da Natureza:
o carvão – que a princípio nos enriquece para depois nos tornar mais pobres do que antes fôramos. Mineiros foram o meu pai e todos os meus irmãos – e orgulhosos da nossa profissão, como os nossos antepassados o tinham sido da deles.
How Green Was My Valley
guião de Philip Dunne
baseado no romance de Richard Llewellyn
realizado por John Ford (1941)