terça-feira, 28 de setembro de 2010

Memórias Intactas

Meditei durante anos, de fora, a pequena casa de um piso onde Cesário terá morrido, ao Paço do Lumiar, no limiar da cidade, fronteira da febre. Quintas e quintais, o ar desflorido de Julho, o calor macio das sombras. O largo. O desplante teimoso da capela. Casa adentro: quartos escuros, móveis simples, passos leves, sustido tinir de louças, perfumes de sabão e de legumes, melancolia, fruta fresca, cesário verde. Campos em farrapos amainando, desolados e chãos, mal deixam adivinhar as maquinações de um futuro delírio fabril e triunfal. Depois, despenhado de altos andaimes, o sonho de vidro transparente que parecia poder conter a dor humana e talvez tocar o céu, tombou, longitudinal e sem glória, alongando além de si a cidade, desaguando em ocidental desencanto por tristes cafés de subúrbio.