segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Alma complicada

Bem sei que na nossa alma complicada coexistem, por assim dizer, todos os contrários. Também somos, por vezes, violentos, e há em nós muita dureza ao lado da doçura. Fomos um povo mercantil, pragmático, positivo e realista. No entanto, o espanhol Eugenio Montes, num ensaio intitulado Portugal ou a invenção do romantismo, dizendo que os marinheiros portugueses trouxeram do Oriente o lastro da melancolia, pôde escrever: «Desembarca na Europa o barroco. Uma sombra acompanha o viajante. É a sombra, o fantasma do romantismo. O romantismo: uma coisa que é, na essência, uma aventura, e em Portugal quer ser uma pátria.» Fala-se muito, de resto, nos fins utilitários que perseguimos nas descobertas. Mas se eramos assim tão práticos, porque perdemos tudo quanto ganhámos? [...] É que, em nós, a ambição alia-se à imprevidência; o espírito de lucro à incapacidade administrativa.

José Osório de Oliveira, em «Psicologia de Portugal», Psicologia de Portugal e outros ensaios, 1934.