quarta-feira, 23 de junho de 2010

Memórias Intactas

Costumava vê-la numa esquina da Baixa sempre que vinha a Lisboa, mas tinha pavor de olhar a ausência dos seus olhos. Eramos ambos crianças, e no meu espírito associava-a ao circo citadino, cheio de sustos e de promessas, vislumbres de um mundo mais vasto e variado. A sua face era a face enigmática e terrível do mundo que me era ocultado. Por isso, entre mim e ela o horror vestia um véu de irresistível fascínio. Ao longo de longos anos a reencontrei, sempre intimamente a saudando como a uma remota companheira de infância. Estamos agora mais velhos. Ela é, talvez, a testemunha mais antiga da minha invisível presença na cidade.