Exilío e existência
Sentes-te exilado no teu país cultural. Óptimo. Mas também não sabes donde és. Às vezes, num intervalo parvo, pensas: deves lutar, impor-te, forçar os outros a reconhecerem que existes. Mas obrigar como? O resultado seria falso e colaboravas na hipocrisia. E terias de pôr velas aos que decidem da reputação e carimbam como comestíveis quem entendem, como a carne antes de vir para o talho. Sê sensato. Não é absurdo quereres à força ser gente? Arre, que é seres estúpido. E daí talvez não. Porque se o fosses, já há muito serias gente para os que te negam essa verdade elementar de seres também humanidade. Estás exilado no teu país -- mas donde és? Jamais o saberás. Porque se o soubesses, também não serias de lá.
Vergílio Ferreira, Pensar, Bertrand, Venda Nova, 1992.