segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Texto sobre crianças (que também se aplica a empresas)

O mundo não foi feito para as crianças. Por isso o contacto com ele é sempre doloroso, muitas vezes catastrófico. Se a criança pega numa faca, corta-se; se sobe a uma cadeira, cai; se sai para a rua, é atropelada por um carro. É curioso que, em tantos milhares de anos de civilização, não se tenha feito praticamente nada para mitigar ou solucionar este conflito. Inventaram-se os brinquedos, é certo, que são um mundo em miniatura, à medida das crianças. Mas estas aborrecem-se dos brinquedos e, por imitação, querem constantemente usar as coisas dos adultos. Com que determinação e espontaneidade se precipitam para a idade adulta, que obstinação a sua em imitar os mais velhos. E à custa da dor, aprendem. A condição para progredirem é, justamente, estarem em contacto permanente com o mundo adulto, imenso, enfadonho, desconhecido, doloroso. O ideal, claro, seria que vivessem num mundo à parte, acolchoado, sem facas que cortam nem portas que trilham os dedos, entre crianças. Mas então não evoluiriam. As crianças não aprendem nada com as crianças.

Julio Ramón Ribeyro, Prosas Ápátridas, Edições Ahab, Porto, 2011.